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Medicina veterinária

 No trato alimentar, diversas glândulas
produzem inúmeros tipos de secreções, o que torna o meio aquoso e favorece os
processos de digestão e absorção. Tais secreções são controladas por
substâncias parácrinas, endócrinas e neurais. Um exemplo disso é que o sistema
nervoso autônomo parassimpático é capaz de estimular as secreções glandulares
do trato digestório. Hormônios liberados pelo próprio sistema também são
capazes de influenciar nessas secreções.

Quando a gente pensa nos tipos glandulares
que existem no trato digestório, podemos dar vários exemplos. Na superfície do
epitélio de quase todo sistema, existem glândulas de célula única, conhecidas
como células caliciformes, que são capazes de secretar um muco que protege a
superfície epitelial de irritações. Em diversas regiões do TGI há invaginações
do epitélio na submucosa, as criptas, onde encontramos células secretoras
especializadas. No estômago e no duodeno observam-se glândulas tubulares
profundas, onde diversos tipos de células secretoras são observados. Há outras
glândulas que não estão dentro do trato digestório, mas que fazem parte dele: o
fígado, pâncreas e glândulas salivares.

Glândulas
salivares

Além
de umedecer e lubrificar o bolo alimentar, a saliva é ligeiramente alcalina,
neutralizando os ácidos que podem ser consumidos. Nos ruminantes, a saliva
possui um papel extremamente importante, tendo nesta espécie um pH muito mais
alto (alta concentração de bicarbonato e fosfato) do que nos não ruminantes, o
que permite que ácidos produzidos no processo de fermentação bacteriana do
rúmen sejam neutralizados e tamponados. Outro ponto importante é que em algumas
espécies ela possui uma enzima conhecida como amilase que vai iniciar a
digestão do amido, além de lipase para iniciar a digestão de gordura. Outra
função da saliva é controlar a população bacteriana na faringe pela ação da
lisozima. A secreção das glândulas salivares é produzida nas células acinares e
liberada no lúmen do ácino; conforme ela progride pelos ductos, sua composição
eletrolítica vai sendo modificada. Veja na figura 15 a estrutura de um ácino.

Secreções
gástricas

            No
estômago, dependendo da espécie, podemos observar dois tipos de mucosa:
glandular e aglandular. De modo geral, os animais apresentam apenas a mucosa
glandular, mas em equinos e ratos, por exemplo, a mucosa possui uma região
glandular e outra aglandular. No equino, a divisão entre ambas é bem definida
pela margem pregueada.

            Diferentes
tipos celulares podem ser encontrados na mucosa gástrica. O estômago possui
diversas invaginações, as favéolas. Cada favéola leva a uma glândula
gástrica
ou glândula parietal, que por sua vez é composta pelo
istmo, corpo e colo (observe a estrutura desta glândula na figura 16). A
superfície do estômago, assim como as favéolas, é revestida por células de
superfície da mucosa
, que são capazes de secretar um muco espesso que fica
firmemente aderido e tem a função de proteger a mucosa do ácido clorídrico e de
enzimas proteolíticas. Nas glândulas gástricas, podemos encontrar as células
parietais,
que tem a função de secretar o ácido clorídrico. As células
de mucosa do colo
, além de secretar um muco mais fino, são capazes de se
dividir e se diferenciar em qualquer outro tipo de célula das glândulas do
estômago. As células principais, que ficam na base da gândula, são capazes de
liberar o pepsinogênio, a forma inativa da pepsina.


Resumindo algumas células e suas funções

Produção de ácido
clorídrico

Como já mencionado antes, as células
parietais são capazes de sintetizar o ácido clorídrico quando são estimuladas.
Existem três fatores conhecidos que estimulam o aumento da produção deste
ácido. O primeiro fator é a histamina (secretada por células enteroendócrinas
na base da glândula) que, quando secretada, se difunde até as células parietais
onde encontram seus receptores (receptor de histamina H2). O segundo fator é a
gastrina, que é um hormônio produzido pelas células G na região do piloro e
essas, por sua vez, são estimuladas pela distensão mecânica da parede do
estômago e aumento do pH. O terceiro fator é a acetilcolina liberada pelo nervo
vago.  Ela se liga aos receptores
muscarínicos nas células parietais, no entanto, a célula G também possui
receptores muscarínicos, ou seja, a acetilcolina vai intensificar a secreção de
gastrina.

A presença do alimento não digerido no estômago,
bem como a expectativa pela sua chegada, é capaz de acionar os mecanismos para
a produção de HCL. Na fase cefálica da digestão, a espera pelo alimento
faz com que o nervo vago estimule o sistema nervoso entérico a liberar
acetilcolina. A acetilcolina é capaz de se ligar tanto nas células G quanto nas
parietais. As células G vão responder secretando gastrina, enquanto as células parietais
respondem liberando HCL. A gastrina cai na corrente sanguínea e também se liga
em receptores na célula parietal, estimulando ainda mais a secreção de ácido
clorídrico. Quando o alimento de fato chega ao estômago, começa a fase
gástrica
, onde a distensão da parede causada pelo próprio alimento acaba
liberando acetilcolina, que assim como na fase anterior vai estimular as
células G e parietal, levando ao aumento da secreção de HCL. Existe ainda
células capazes de secretar histamina, as células tipo enterocromafins, que são
estimuladas tanto pela gastrina quanto pela acetil colina. A célula parietal
possui também receptores de histamina, ou seja, quando os três receptores estão
ativados, a secreção de ácido clorídrico é estimulada ao máximo. Veja o esquema
na figura 17.

Quando todos esses estímulos chegam na
célula parietal, a produção do HCL começa, mas ele é formado fora da célula. Vamos
entender como ocorre essa produção. No interior da célula há uma abundância em dióxido
de carbono (Co2) e água (H2O); uma reação ocorre com essas duas moléculas por
conta da anidrase carbônica, uma enzima que catalisa a transformação do
Co2 e H2O em ácido carbônico (H2CO3-). No entanto, o ácido carbônico se
dissocia gerando uma molécula de hidrogênio (H+) e outra de bicarbonato (HCO3).
O H+ é secretado no lúmen da glândula pela bomba de prótons, que troca o
hidrogênio por íons de potássio. O bicarbonato que se acumulou no meio
intracelular é jogado na corrente sanguínea e trocado por uma molécula de
cloreto (Cl-) por meio de um transportador, dessa forma o Cl- ganha o meio
intracelular. Este cloreto acaba sendo cotransportado juntamente com o potássio
para o lúmen gástrico. Neste cenário, temos tanto o H+ quanto o Cl- no lúmen,
ou seja, ocorre a formação de HCL fora da célula. Veja na figura 18.

O
bicarbonato que foi jogado na corrente sanguínea vai gerar uma alcalinização moderada
no sangue, isso leva o nome de maré alcalina ou alcalose pós-prandial.
Esse bicarbonato é usado para neutralizar as secreções gástricas no duodeno,
assim a maré alcalina é revertida. 

Conforme
os níveis de ácido clorídrico aumentam, o pH diminui, e quando está em torno de
2, a secreção de gastrina diminui por um sistema de feedback negativo, ou seja,
a secreção de HCL diminui.

Secreção de
pepsina

            A pepsina é na verdade uma família
de enzimas que digere proteínas. Elas são sintetizadas pelas células principais
nas glândulas gástricas, porém são produzidas em sua forma inativa, o
pepsinogênio. O pepsinogênio fica estocado dentro da célula até que o momento
para sua secreção ocorra. Quando secretada, o pH baixo do estômago faz com que
a molécula se ative. 
Todas as enzimas que são secretadas
na sua forma inativa são chamadas de zimogênios.

Secreção
pancreática

O pâncreas é composto por uma parte
endócrina formada pelas ilhotas pancreáticas e uma porção exócrina formada
pelos ácinos, que, por sua vez, são conectados por um sistema ramificado de
ductos. Na porção exócrina, são produzidas diversas enzimas que pode digerir os
principais macronutriente: gordura, carboidratos e proteínas. As enzimas que
digere proteína ficam na forma inativa, grânulos de zimogênio, dentro do
pâncreas, pois elas são prejudiciais ao tecido e devem ser ativadas apenas na
luz do duodeno.

Na junção entre o ácino e o ducto,
existem células especializadas conhecidas como células centroacinares, que
possuem a função de modificar a composição eletrolítica da secreção produzida.
Essas células conseguem alcalinizar o liquido, pois elas o enriquecem com a
secreção de bicarbonato.

O estímulo para as secreções
pancreáticas ocorre por 3 diferentes substâncias: a acetilcolina (ACh),
secretina e colecistocinina (CCK). As células pancreáticas possuem os 3 tipos
de receptores. A CCK é o principal hormônio que estimula as células acinares e
a secretina é o principal que estimula as células centroacinares. A ACh é
liberada pelas terminações nervosas. Quando os três receptores estão ativados,
a secreção pancreática é intensificada ao máximo. Na fase cefálica da digestão,
os estímulos vagais estimulam a liberação de suco pancreático. Na fase gástrica
também ocorre estímulo por conta da distensão da parede do estômago, que dispara
o reflexo vagovagal. Ambas as fases preparam o intestino para receber o
alimento.

Quando o alimento de fato chega ao
intestino, a fase intestinal é iniciada. Quando o quimo chega ao
duodeno, ocorre uma distensão da parede, gerando uma resposta do SNE com
secreção de acetilcolina, o que estimula as células pancreáticas. Além disso, a
presença de alimento com um pH baixo estimula a secreção de secretina. A
gordura presente na ingesta, bem como os peptídeos, vão estimular a secreção de
CCK. Todos estes eventos da fase intestinal, vão intensificar os efeitos da
fase cefálica. Quando a ingesta chega ao duodeno com o pH baixo, ela precisa
ser alcalinizada, pois as enzimas digestivas do duodeno trabalham melhor em pH
alcalino. Por esse motivo, a secretina é liberada e estimula as células
centroacinares, o que permite que o suco pancreático rico em bicarbonato
alcalinize a ingesta recém-chegada.  

Secreção biliar

            O fígado é composto por diversas placas
formadas pelos hepatócitos. Dentre as placas encontramos os canalículos
biliares. Os hepatócitos sintetizam e secretam a bile nos canalículos e por fim
ela é escoada até a vesícula biliar. A bile é composta pelos fosfolipídios e
colesterol, que ficam mantidos em solução aquosa pela ação dos ácidos
biliares
. Os ácidos biliares são formados a partir do colesterol. Os
hepatócitos promovem alterações químicas no colesterol que deixa a molécula com
porções hidrofílicas e hidrofóbicas (lembrando que o colesterol é hidrofóbico).
A função dos ácidos biliares é fazer a emulsificação da gordura do alimento
para que ela se torne solúvel em água.  Os
ácidos biliares, fosfolipídios e o colesterol são os principais componentes da
bile. Depois de sintetizada, ela é estocada na vesícula biliar.


            Como já foi explicado, quando o
alimento gorduroso chega ao duodeno, ele estimula a secreção de CCK. Além da
ação no pâncreas, a CCK promove o relaxamento do esfíncter de Oddi
e contração da vesícula biliar. Após o auxilio na digestão de gordura, os
ácidos biliares são reabsorvidos no íleo e reciclados e estimulam a secreção de
mais bile. Esse fluxo que acontece com essas moléculas de ir para o intestino e
depois ser reciclado pelo fígado é chamado de circulação êntero-hepática

Veja a aula sobre secreções do trato gastrointestinal

Mapeamento dos conceitos


Referências

REECE – Dukes- Fisiologia dos Animais Domésticos. 13ª ed. Rio de Janeiro: Editora
Guanabara Koogan S.A., 2017.
CUNNINGHAN. J.G. Tratado de Fisiologia veterinária. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan. 2014.
GUYTON, A.C., HALL, J.E. Tratado de Fisiologia Médica. 12ª ed. Editora Guanabara- Koogan, 2011.
JUNQUEIRA, L. C.; CARNEIRO, J. Histologia básica: texto e atlas. 12.ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2013. p. 4.
KIERSZENBAUM, A.L. Histologia e Biologia Celular – Uma Introdução à Patologia –
MosbyElsevier 2ª ed. 2008, 677p.

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