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Medicina veterinária

Como já citado anteriormente, o TGI possui em sua estrutura geral uma camada mucosa, submucosa, muscular (circular interna e longitudinal externa) e serosa. Na mucosa, ainda existe uma camada de musculo, a muscular da mucosa. As camadas musculares proporcionam ao trato digestório a capacidade de gerar movimentos, tais movimentos levam o nome de motilidade.

A motilidade pode ser de natureza
propulsora, retentiva ou mista. De acordo com a natureza do movimento, ele dará
origem a algumas funções: propulsão (passar o alimento para o próximo
segmento), retenção (permite que a ingesta seja digerida, absorvida ou
armazenada), quebra física (para que ele seja misturado com as secreções) e
circular a ingesta para aumentar o contato com a superfície absortiva. Para que
o alimento se desloque de um local para o outro, é necessário um tempo, esse
tempo é conhecido como tempo de trânsito. O tempo de trânsito pode
variar de acordo com o movimento que está ocorrendo no momento. Se os
movimentos de retenção e mistura estão elevados, o tempo de trânsito é maior,
pois ele ficará por mais tempo em determinado local, mas se os movimentos de
propulsão se sobressaem, o tempo de trânsito é menor, pois o alimento está
sendo empurrado para o próximo segmento, levando menos tempo para se deslocar. Outro
conceito importante é sobre o sentido que a ingesta se desloca; quando é em
sentido ao anus, o movimento é denominado aboral, mas quando é em
sentido a boca, o sentido é oral.

Funcionamento do músculo gastrointestinal

            As
fibras musculares lisas do TGI ficam dispostas em feixes paralelos e estas se comunicam
entre si por meio de junções comunicantes, os nexos. Tais junções
permitem que íons passem de uma célula muscular para outra, ou seja, há uma
conexão elétrica entre essas células, o que permite que o musculo liso funcione
como um sincício. Isso significa que, se ocorrer uma alteração elétrica
em qualquer ponto da massa muscular intestinal, a alteração irá passar para
todas as células musculares daquela camada e todas funcionarão como se fosse
uma só (figura 6).

 

Outro ponto importante é sobre a atividade elétrica do músculo liso GI. No trato digestório, existem células especializadas interpostas ao musculo liso, que ficam entrelaçadas e possuem a capacidade de originar ondas elétricas, as células intersticiais de cajal (CIC), veja na figura 7. Tais células atuam como um marca-passos elétrico e sua atividade elétrica forma o que é conhecido como ondas lentas. As ondas lentas são na verdade variações do potencial de membrana que se propaga por toda a musculatura gastrointestinal. O potencial de membrana na célula muscular fica em torno de -70 m V e, por conta das CIC, ele flutua para níveis em torno de – 20 m V e nunca chega ao limiar de disparo para acontecer o potencial de ação (figura 8). As ondas lentas existem em todas as espécies, mas sua frequência é variável, por exemplo, no cão, ela ocorre cerca de 20 vezes por minuto no intestino delgado e cerca de 5 vezes no intestino grosso e estômago. As ondas lentas são necessárias para a contração muscular e ela vai determinar o ritmo de contração, isso significa que, se a gente pegar o exemplo do cão onde ocorrem cerca de 5 ondas lentas por minuto no estômago, o ritmo de contração desse segmento e de 5 vezes por minuto. A propagação das ondas lentas ocorre em sentido aboral.

Contração
do musculo liso gastrointestinal

      A
todo momento as ondas lentas estão passando pelo musculo liso do trato GI, mas
elas não estimulam a contração.  Para que
a contração ocorra, se faz necessário que aconteçam potenciais em ponta, que
são verdadeiros potenciais de ação. Quando o pico das ondas lentas atinge
certos níveis (mais próximo de 0 milivolts) e ficam mais positivos, os
potenciais de ação surgem e isso desencadeia a contração. O estímulo para a
contração ocorre quando células endócrinas, parácrinas ou neurônios liberam
substâncias reguladoras nas proximidades do músculo. Estas moléculas, quando
excitatórias, influenciam a célula muscular lisa a ficar mais positiva, pois
elas afetam os canais iônicos, permitindo que ocorra o potencial de ação e, por
fim, a contração. Em resumo, as ondas lentas passam a todo momento no TGI e
quando determinada região é sensibilizada por substâncias reguladoras
excitatórias, o pico da onda lenda fica mais positivo   

      A
integração do sistema nervoso entérico e sistema endócrino/parácrino permite
que a contração aconteça de forma sincronizada. Tal sincronismo permite que todas
as células de um determinado segmento possam se contrair por igual. A
quantidade de ondas lentas que passam na região determina a quantidade de
movimentos que o segmento é capaz de fazer, por exemplo: no estômago ocorrem
cinco ondas lentas por minuto, então ele pode contrair no máximo cinco vezes
por minuto.

Padrões de motilidade

Esôfago

      Assim
como em outras regiões do TGI, o esôfago também é composto por uma camada
muscular circular interna e longitudinal externa. No entanto, diferente de
outras porções, na maioria dos animais domésticos, a musculatura é composta por
musculo estriado esquelético. O esôfago é basicamente um tubo que conduz o
alimento até o estômago através de movimentos peristálticos. O peristaltismo é
o movimento propulsivo básico do trato gastrointestinal e consiste em um anel
contrátil que surge em um ponto e se move adiante; tal movimento é como se estivesse
colocando o dedo ao redor de um tubo fino distendido, apertando este tubo e
escorregando o dedo adiante. Veja na figura 9.

Estômago         

Quando a gente fala de estômago, nas
diferentes espécies encontramos diferenças anatômicas e fisiológicas. Os
ruminantes são animais que possuem estômago composto, nestes animais os padrões
de motilidade diferem daqueles encontrados em animais de estômago simples.
Deixando um pouco de lado os ruminantes, que é um pouco mais complexo, vamos
ver o funcionamento do estômago dos animais monogástricos. Primeiramente,
podemos dividir este órgão em duas porções fisiológicas, o estômago proximal e
o distal.

Quando o alimento chega no estômago, o
primeiro fenômeno que ocorre é o relaxamento adaptativo, isso permite
que ele relaxe e armazene o alimento recém-chegado. O estômago proximal
apresenta contrações fracas e continuas e sua função é basicamente armazenar o
alimento e enviar de uma forma suave para o estômago distal. Por outro lado, o
estômago distal tem a função de triturar o alimento e envia-lo em uma
velocidade controlada ao duodeno; esta parte possui contrações mais fortes, que
começam no corpo e migram em direção ao piloro. Essa contração move o alimento
em direção ao piloro, de forma que apenas partículas menores do que dois
milímetros de diâmetro conseguem passar pelo piloro e as partículas maiores
acabam retornando novamente em direção ao antro. Esse padrão se repete até que
as partículas estejam em tamanho adequado para passar para o duodeno. Nesta
porção mais distal, os movimentos promovem a propulsão e a mistura, mas também
tem função de triturar. O alimento processado nessa região, após ser misturado
com as secreções, recebe o nome de quimo.  

Quando o estômago fica por horas
vazio, ele dá origem as contrações de fome, que são contrações rítmicas
do corpo do estômago.

Esvaziamento
gástrico

O nervo vago inerva o estômago e tem amplo
controle sobre a motilidade gástrica. Todos esses movimentos mencionados
anteriormente ocorrem na fase digestiva. Na porção proximal, o estímulo
vagal promove o relaxamento adaptativo, enquanto na parte distal ele promove as
contrações mais fortes do piloro. As contrações intensas do antro vão
possibilitar o esvaziamento gástrico. A velocidade do esvaziamento é controlada
tanto por sinais do próprio estômago quanto do duodeno, entretanto os sinais do
duodeno são mais intensos. O quimo precisa ser liberado em uma velocidade
suficiente para que dê tempo de ele ser digerido e absorvido pelo duodeno.
Quando o quimo chega ao estômago, ele dá origem ao reflexo enterogástrico. Tal
reflexo é capaz de retardar ou até mesmo interromper o esvaziamento gástrico e
ele pode ser mediado pelo sistema nervoso entérico, sistema nervoso central e
sistema endócrino do TGI.

Fase
cefálica da digestão

Antes da chegada do alimento ao estômago, a
expectativa de receber o alimento promove alterações na motilidade e secreções
gástricas. O estímulo é dado pelo nervo vago e prepara o estômago para receber
o alimento. Essas reações são aumentadas quando o alimento, de fato, chega ao
estômago.

Fase
interdigestiva

Alguns materiais que não foram reduzidos a
partículas pequenas na fase digestiva (osso, por exemplo) são varridos do
estômago na fase interdigestiva, que é a fase entre as refeições. Nesta fase,
ocorrem ondas peristálticas fortes que se propagam pelo antro e varre tudo
aquilo que não foi digerido na fase digestiva, esse movimento é conhecido como complexo
interdigestivo de motilidade
.

Intestino
delgado

No intestino delgado, podemos observar
duas fases: digestiva e interdigestiva.

Fase digestiva: nesta fase, existem dois padrões de
movimento: movimentos propulsivos e movimentos não propulsivos,
ou de mistura. Começando pelo não propulsivo, este são movimentos de
segmentação; quando o quimo chega ao intestino delgado, a distensão da parede
causada provoca contrações concêntricas que divide o lúmen em segmentos
contraídos e outros relaxados. Logo após, as regiões dilatadas se contraem
dividindo o alimento (que é praticamente liquido nesta porção) e misturando com
as secreções (veja na figura 12). Os movimentos propulsivos consistem em ondas
peristálticas que percorrem pelo intestino. Essas ondas são curtas e empurram a
ingesta para frente (veja na figura 13) e, então, ocorrem novos movimentos de
mistura (segmentação).

Fase interdigestiva: aqui ocorrem ondas peristálticas fortes que,
por vezes, percorrem toda a extensão do órgão. Da mesma maneira que ocorre no
estômago, sua função é fazer uma limpeza que remove tudo aquilo que não foi
digerido, além de controlar a população bacteriana no intestino delgado. Essa
onda peristáltica é referida como complexo mioelétrico migrante ou complexo
motor migrante.

Intestino
grosso

         Na
junção entre o intestino delgado e o intestino grosso, existe um anel de
músculo circular que fica fechado a maior parte do tempo, o esfíncter
ileocecal
. Além disso, existe uma dobra da mucosa que se projeta para a luz
do ceco e se fecha para evitar que o conteúdo do intestino grosso retorne para
o intestino delgado, essa estrutura é a válvula ileocecal.

         De
modo geral, o intestino grosso possui a função de absorver água e eletrólitos
do quimo para formar as fezes, armazenamento das fezes para que ela possa ser
expelida posteriormente e fermentação de matéria orgânica. Como sabemos, nas
diferentes espécies, o tamanho do colón varia, já que muitas espécies fazem
fermentação neste local e suas necessidades energéticas são supridas a partir
daí. No entanto, os padrões de motilidade são semelhantes nas diferentes
espécies. Este segmento realiza movimentos de mistura pela segmentação e outros
tipos de motilidade. Diferente de outras regiões, a mucosa colônica faz
movimentos de retropulsão (antiperistaltismo), ou seja, movimentos em sentido
oral. O SNE consegue alterar a origem das ondas lentas e sua propagação
(sentido oral), tornando possível a retropulsão.

Veja a vídeo aula sobre o assunto

Mapeamento dos conceitos

Referências

REECE – Dukes- Fisiologia dos Animais Domésticos. 13ª ed. Rio de Janeiro: Editora
Guanabara Koogan S.A., 2017.
CUNNINGHAN. J.G. Tratado de Fisiologia veterinária. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan. 2014.
GUYTON, A.C., HALL, J.E. Tratado de Fisiologia Médica. 12ª ed. Editora Guanabara- Koogan, 2011.
JUNQUEIRA, L. C.; CARNEIRO, J. Histologia básica: texto e atlas. 12.ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2013. p. 4.
KIERSZENBAUM, A.L. Histologia e Biologia Celular – Uma Introdução à Patologia –
MosbyElsevier 2ª ed. 2008, 677p.

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